Como se sabe, a legislação pátria conferiu proteção legal ao bem de família, tendo sido promulgada a lei nº 8.009/90 com intuito único de dispor sobre a impenhorabilidade do referido bem definindo, em seu art. 1º que “O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.”
Ainda que a impenhorabilidade do bem de família não seja assunto novo, há, ainda hoje, diversas discussões sobre o tema, seja quanto ao real alcance da proteção legal, ou sobre situações específicas em que se discute se a previsão legal recai, ou não, sobre determinado imóvel.
Assim, recentemente houve dois julgamentos no Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o tema, sendo que ambos convergiram no sentido de ampliar a presunção de impenhorabilidade do Imóvel entendido como bem de família.
No Recurso Especial nº 1.851.893 – MG, julgado pela Terceira Turma do STJ, discutia-se se o bem do casal emprestado para os sogros poderia ter a si conferida a proteção legal da impenhorabilidade.
No referido Recurso Especial restou definido, por unanimidade, que para efeitos da proteção da Lei 8.009/1990, é suficiente que o imóvel sirva de residência para a família do devedor – ainda que ele não more no mesmo local –, apenas podendo ser afastada a regra da impenhorabilidade do bem de família quando verificada alguma das hipóteses do artigo 3º da lei.
O relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, explicou que a Lei 8.009/1990 foi editada com a finalidade de proteção da família e, sob o espectro do princípio do patrimônio mínimo, proteger a dignidade da pessoa humana.
O entendimento foi de que o fato de o único imóvel não servir para residência da entidade familiar não descaracteriza, por si só, o instituto do bem de família, tanto é que se admite a locação do imóvel para que ele gere frutos e possibilite à família constituir moradia em outro bem alugado.
Assim, entendeu a Turma Julgadora que o imóvel, embora cedido aos sogros, manteve-se com as características de bem de família e, consequentemente, abrigado pela impenhorabilidade, tendo constado do voto do relator que "...o conceito de família foi ampliado e fundamenta-se, principalmente, no afeto, de modo que não apenas o imóvel habitado pela família nuclear é passível de proteção como bem família, mas também aquele em que reside a família extensa, notadamente em virtude do princípio da solidariedade social e familiar, que impõe um cuidado mútuo entre os seus integrantes".
Em outra discussão recente sobre o tema da impenhorabilidade do bem de família, agora perante a Quarta Turma do STJ, definiu-se que o imóvel adquirido no curso de demanda executiva pode ser considerado bem de família, para fins de impenhorabilidade.
A discussão posta no Recurso Especial nº 1792265 / SP pelo credor foi no sentido de ver declarada impossibilidade de reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel quando o bem foi adquirido no curso da execução, pois aos olhos do credor a impenhorabilidade sobre o imóvel somente valeria para dívidas futuras.
O relator, ministro Luis Felipe Salomão, entendeu, no entanto, e foi seguido por seus pares, que "só o fato de ser o imóvel residencial bem único do recorrido, sobre ele, necessariamente, incidirão as normas da Lei 8.009/1990, mormente a impenhorabilidade questionada pelo exequente".
Acrescentou o relator, em voto acompanhado pela unanimidade dos ministros julgadores que o imóvel adquirido somente não receberia a proteção da Lei 8.009/1990 caso o devedor possuísse outro imóvel, de valor inferior e nele também residisse ou caso fosse comprovada a má fé do devedor.
Dessa forma, o que se extrai dos recentes julgados do STJ é que a proteção legal conferida ao bem de família vem tendo a sua presunção ratificada mesmo em situações específicas onde poder-se-ia pensar, em um primeiro olhar, que o Imóvel não estaria abrigado pelo conceito trazido no art. 1º da lei 8009/90.
Theodoro Focaccia Saibro